A Gênese, capítulo XII itens 12,15,16,17,18,19

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são textos originais de Kardec!
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  1. – Para Espíritos incultos, sem nenhuma ideia das leis gerais, incapazes de abranger o conjunto e conceber o infinito, essa criação miraculosa e instantânea tinha algo de fantástico que impressionava a imaginação. O quadro do Universo tirado do nada, em poucos dias, por um só ato da vontade criadora, era para eles a marca mais magnífica do poder de Deus. Que descrição mais sublime e mais poética desse poder, nessas palavras: “Deus disse: que a luz se faça e a luz se fez!” O Universo sendo criado lenta e gradualmente, pelo cumprimento das leis da natureza, pareceria que Deus fosse menor e menos poderoso; era-lhe preciso algo de maravilhoso que saísse das vias comuns, senão teriam dito que Deus não era mais hábil que os homens. Uma teoria científica e racional da Criação tê-los-ia deixado frios e indiferentes.

Os homens primitivos são como as crianças, às quais é preciso dar apenas o alimento intelectual que comporte sua inteligência. Atualmente, que estamos esclarecidos pelas luzes da Ciência, relevamos os erros materiais do relato de Moisés, mas não o censuramos por ter falado a linguagem do seu tempo, sem o que não seria nem compreendido nem aceito.

Respeitemos essas descrições que nos parecem pueris atualmente, como respeitamos os apólogos que clarearam nossa primeira infância e abriram a inteligência, ensinando-nos a pensar. Foi com esses quadros que Moisés incutiu, nos corações dos homens primitivos, a fé em Deus e em seu poder; fé ingênua que devia se purificar mais tarde, ao brilho da Ciência. Saibamos ler corretamente, e não desprezemos o livro onde aprendemos a soletrar.

Não rejeitemos, pois, a Gênese bíblica; estudemo-la, pelo contrário, como se estuda a História da infância dos povos. É uma epopeia rica em alegorias, cujo sentido oculto precisamos procurar; sendo necessário comentar e explicar, com a ajuda das luzes da razão e da Ciência. Ressaltemos as belezas poéticas e as instruções veladas, sob a forma de metáforas, mas é preciso demonstrar claramente os erros, no próprio interesse da religião. Esta será melhor respeitada, quando esses erros não forem mais impostos pela fé, como verdades, e Deus parecerá maior e mais poderoso, quando seu nome não estiver mais misturado a fatos controversos.

  1. Sob uma imagem pueril e, por vezes, ridícula, se nos prendermos a forma, a alegoria oculta por vezes, as maiores verdades. Existe uma fábula mais absurda, à primeira vista, que a de Saturno, um deus devorando pedras que ele tomara por seus filhos? Mas, ao mesmo tempo, o que há de mais profundamente filosófico que essa figura, se nela procurarmos o sentido moral? Saturno é a personificação do tempo; todas as coisas, sendo a obra do tempo, ele será o pai de tudo o que exista, mas também tudo se destrói com o tempo. Saturno, devorando as pedras, é o emblema da destruição pelo tempo, dos corpos, os mais duros que são seus filhos, já que eles se formaram com o tempo.

O que escapa a essa destruição a partir dessa alegoria? Júpiter, o emblema da inteligência superior, do princípio espiritual, que é indestrutível. Essa imagem é mesmo tão natural que, na linguagem moderna, sem alusão à fabula antiga, diz-se de uma coisa deteriorada ao longo dos anos, que ela é devorada pelo tempo, corroída e devastada pelo tempo.

 

  1. – Toda a mitologia pagã, na realidade, é apenar um vasto quadro alegórico dos diversos lados bons e maus da humanidade. Para aqueles que procuram seu espírito, é um curso completo da mais alta filosofia, como o são nossas fábulas modernas. O absurdo seria tomarmos a forma pelo fundo; mas os sacerdotes pagãos só ensinaram a forma, seja porque alguns nada mais soubessem, seja porque tivessem interesse em manter o povo na crença, que favorecia seu domínio, sendo mais produtivas que a filosofia. A veneração do povo pela forma era uma fonte inesgotável de riquezas, representada pelos donativos acumulados nos templos, as oferendas e os sacrifícios oferecidos aos deuses, mas que na realidade, eram em proveito de seus representantes. Um povo menos crédulo, teria doado menos às imagens, às estátuas, aos símbolos e aos oráculos. Sócrates foi condenado como ímpio, a beber cicuta, por ter querido secar essa fonte, colocando a verdade no lugar do erro. Nessa época, não se costumava queimar os herejes vivos; e cinco séculos mais tarde, Cristo foi condenado a uma morte infamante, como ímpio, por ter, como Sócrates, desejado substituir a letra pelo espírito, e porque sua doutrina, toda espiritual, destruia a supremacia dos escribas,dos fariseus e doutores da lei.


  1. – O mesmo ocorre com a Gênese, onde é preciso ver as grandes verdades morais, sob figuras materiais que, tomadas literalmente seriam tão absurdas quanto nossas fábulas, se considerassemos literalmente as cenas e os diálogos atribuídos aos animais.

Adão é a personificação da humanidade; sua falta individualiza a fraqueza do homem, em quem predominam os instintos materiais, aos quais ele não sabe resistir.

A árvore, como árvore da vida, é o símbolo da vida espiritual; como árvore da Ciência, é o símbolo da consciência que o homem adquire do bem e do mal, pelo desenvolvimento de sua inteligência e o do livre arbítrio, em virtude do qual ele escolhe entre os dois. Marca o ponto no qual a alma do homem, cessando de ser conduzida pelos seus instintos, toma posse de sua liberdade e incorre na responsabilidade de seus atos. O fruto da árvore simboliza o objeto dos desejos materiais do homem; é a alegoria da cobiça; resume sob uma só figura, os motivos do arrastamento ao mal; comer, é sucumbir à tentação. (6) A árvore cresce no meio do jardim de delícias, para mostrar que a sedução está no próprio centro/núcleo dos prazeres; e mostrar, ao mesmo tempo que, se o homem dá prioridade aos prazeres materiais, ele se prende à Terra e se distancia de seu destino espiritual.

A morte da qual está ameaçado caso enfrente a proibição que lhe é feita, é uma advertência das consequências inevitáveis, físicas e morais, que arrastam a violação das leis divinas que Deus gravou em sua consciência. É bem evidente que não se trata da morte corporal, já que, após sua falta, Adão viveu por longo tempo, bem antes da morte, mas da perda dos bens que resultam do progresso moral, da qual sua expulsão do jardim de delícias é a imagem.

A serpente está longe de ser, atualmente, símbolo de astúcia; entra aqui, mais por sua forma que por sua índole, sendo uma alusão à perfídia dos maus conselhos que se insinuam como a serpente, e dos quais, frequentemente, não se desconfia. Se a serpente, por ter enganado a mulher, foi condenada a rastejar sobre o ventre, seria preciso dizer que anteriormente ela tinha pernas, e então, não seria uma serpente.

Por que impor como verdade, à fé ingênua e crédula das crianças, alegorias tão evidentes, e que, iludindo o seu julgamento, fazem-nas mais tarde, verem a Bíblia como uma trama de fábulas absurdas?

  1. Se a falta de Adão é literalmente ter comido uma fruta, ela não poderia, incontestavelmente, por sua natureza quase pueril, justificar o rigor com que foi punido. Não se poderia admitir, racionalmente, que o fato seja como geralmente se supõe. Senão, Deus, considerando este fato como um crime irremissível, teria condenado sua própria obra, já que tinha criado o homem para a propagação. Se Adão entendeu dessa maneira a proibição de tocar na fruta da árvore e ele se tornasse escrupulosamente conformado, onde estaria a humanidade e o que teria sido dos descendentes do Criador? Se fosse assim, Deus teria criado o imenso aparelho do Universo para dois indivíduos e a humanidade teria vindo contra sua vontade e suas previsões. Deus não teria jamais criado Adão e Eva para ficarem sós na Terra; e a prova está mesmo nestas palavras que ele lhes endereçou, imediatamente após sua criação, quando eles ainda estavam no paraíso terreal; “Deus os abençoou e lhes disse: Crescei e multiplicai-vos, enchei a Terra e a subjugueis”. (cap.I, v.28). Se, a multiplicação do homem era uma lei desde o paraíso terrestre, sua expulsão não pode ter como causa, o fato suposto.

O que deu crédito a essa suposição, é o sentimento de vergonha que Adão e Eva sentiram, ante o olhar de Deus, e que os levaram a se cobrir. Mas essa vergonha, ela mesmo, é uma figura de comparação: simboliza a confusão que todo culpado sente, na presença daquele que tenha ofendido.

  1. – Qual é, pois, em definitivo, essa falta tão grande que tenha resultado na reprovação à perpetuidade de todos os descendentes daquele que a tenha cometido? Caim, o fratricida não foi tratado tão severamente. Nenhum teólogo pôde defini-la, logicamente, porque todos, não saindo do sentido literal, ficam girando num círculo vicioso. Atualmente, sabemos que essa falta não é um fato isolado, pessoal de um indivíduo, mas ela envolve, sob um fato alegórico único, o conjunto dos abusos dos quais a humanidade da Terra, ainda imperfeita, pode tornar-se culpada, e que se resumem nestas palavras: infração às leis de Deus. Eis porque a falta do primeiro homem, simbolizando a humanidade, é simbolizada por um ato de desobediência.

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